Leandro Resende e Jullyanna Matos
Existem duplas e existe a dupla André e Freitas. Juntos há décadas, foram de consultores do setor de turismo à maiores empreendedores no País, quando ainda davam nome a WAM (o A era de André e o M, de Marcos Freitas). Hoje são apenas AM Invest Group. Neste material a seguir, a dupla AM fala sobre novos negócios, como saúde privada, gastronomia, entretenimento, turismo e expansão do grupo. Leia a entrevista em que os empresários preveem o primeiro bilhão, a internacionalização, o IPO, a saída da WAM e entre outras tantas oportunidades.
Quando começa a relação André e Freitas?
Freitas – No Rio Quente Resorts. Eu entrei antes, em 1991. Comecei como gerente de Orçamento e Finanças, passei por Contabilidade e Controladoria, Gerência Geral Financeira, até chegar a Diretor Financeiro estatutário, em 2000. No ano seguinte, assumi a Superintendência, o principal cargo executivo do grupo. Neste período, implantei o timeshare no grupo. Fiquei dois anos – quando encerrou a briga societária entre Gebepar e a Algar.
André – Eu começo no grupo em 1998. Antes, trabalhei no Sesc, entre outros, já em Caldas Novas. Tive a oportunidade de ir para o Rio Quente como estagiário, em uma área que o Freitas criou, o Centro de Aperfeiçoamento de Talentos Humanos. Comecei como assessor do coordenador de Alimentos e Bebidas, o Benê, na época. Quando surgiu o timeshare do Rio Quente eu migrei. O sonho dos funcionários era trabalhar no timeshare.
O timeshare funcionou de imediato?
Freitas – Não. Começamos o timeshare no Rio Quente em novembro de 1999. Fomos buscar lá fora. Eu fiquei 15 dias nos Estados Unidos. Fiquei sete dias com toda equipe. Depois fiquei mais sete dias lá estudando, pesquisando. E aqui no Brasil não tinha nada. Não tinha profissional, não tinha consultoria, nada. Fomos buscar uma consultoria argentina na época. Vieram argentinos, depois os mexicanos. Começamos um timeshare estilo México, estilo Estados Unidos. E, em um ano, a gente teve de mudar porque os clientes estavam fugindo do Rio Quente, era um estilo extremamente agressivo. Os clientes que não compravam saíam ofendidos. Em um ano, a gente tropicalizou o timeshare. Mudamos a cara do timeshare no Brasil como um todo. E fomos tirando os “gringos”.
André – É isso que eu ia falar, Freitas. O timeshare do Rio Quente não foi simplesmente um timeshare criado para um resort. Foi um divisor de águas da sua chegada no Brasil. Existe o antes do Rio Quente e o depois do Rio Quente. E não foi só no aspecto de adaptação da venda, mas do negócio em si e na seriedade do projeto. Antes tinha muito “picareta”. A chancela do Rio Quente se torna referência.
Freitas – E os grandes grupos vieram atrás.
Quando acaba o ciclo do Rio Quente?
André – Eu saí em 2004, 2005. Saí e fui para Fortaleza, para o grupo português Pestana. Eu fiquei um bom tempo até voltar para o Privé.
Freitas – Eu saí em 2003. Fui começar a minha vida de empresário, em Caldas Novas. Deu tudo errado. Em 2005, fechei a empresa e vim para Goiânia.
Quando vocês se juntaram de novo?
Freitas – No Privé. Porque eu saí de Caldas em 2005, vim para cá. Em 2006, já comecei a tratar de assuntos com o Privé e, em junho de 2007, a gente começou a operação de timeshare. Eu era consultor e André chegou um pouco depois.
Era o embrião da WAM Brasil?
Freitas – A WAM vem em 2012. O Waldo (Palmerston) recebeu a proposta de ir para Olímpia (SP). Até então o grupo nunca tinha saído de Caldas Novas. Eu e o André já estávamos prestando serviço. Foi quando ele sugeriu a parceria, a sociedade. Criamos a WAM.
A WAM seria a empresa que faria esse timeshare fora do Grupo Privé? E, poucos anos depois, compraria o próprio Privé.
Freitas – Isso.
André – É que algumas pessoas acham que a WAM nasceu em Caldas, mas na verdade nasceu em Olímpia, depois veio para Caldas e, por fim, Goiânia. A base administrativa da WAM, de fato, sempre foi Goiânia. Era dentro do escritório do Privé, uma salinha onde o Freitas dividia a mesa com mais dois ou três colaboradores.
A WAM surpreendeu o mercado. Estava no radar essa expansão veloz?
Freitas – Não, não! Na verdade, a gente começou como comercializador. A gente só fazia venda.
André – Disso eu posso falar. Eu e o Freitas, sempre gostamos de ficar sentado um ao lado do outro. E ele com essa agendinha. Ele chegava lá e começava a fazer as contas. E aí terminava de fazer, me chamava: ‘vem ver isso aqui. No ano tal, nós vamos ser isso. No ano tal, nós vamos vender isso. No ano tal, nós vamos ser o maior do Brasil.’ Eu olhava aquilo no papel e falava assim: ‘rapaz, amém, se Deus quiser’. E tudo que ele escreveu, aconteceu.
Como foi a verticalização da WAM?
Freitas – Em 2015, foi a nossa primeira participação em incorporação. Se não me engano, foi Porto Seguro. Uma coisa é você comercializar, a outra é você entrar no ramo de incorporação imobiliária, onde os volumes aumentam significativamente. Foi aí que caiu a ficha: opa! Esse negócio vai ser grande. E começamos a planejar.
André – E por consequência veio a administração hoteleira.
Freitas – Sim, aí veio a indústria. A verticalização é ideia nossa. Participamos da lei e do manual de boas práticas da multipropriedade com essa nossa ideia.
E o empreendedor de turismo no Brasil?
Freitas – Eu não vou precisar bem os números, mas comparando a indústria hoteleira do Brasil com os Estados Unidos, os Estados Unidos, 70% da indústria hoteleira são grandes cadeias hoteleiras e, no Brasil, é o inverso. Cerca de 70% são hoteleiros familiares. Esses são os mais difíceis. Com o tempo melhorou a mentalidade? Eu diria que nem tanto. Hoje você pega o hoteleiro ainda tradicional, que não enxerga o timeshare.
André – Concordo com o Freitas no aspecto de que a cabeça não mudou muito, mas, em contrapartida, você teve uma fase do timeshare e agora, de forma muito forte, a multipropriedade, que chamou muita atenção desses empreendedores.
O timeshare trouxe também a gestão para outro patamar?
André – Houve uma fragmentação do conceito, chegou um momento em que você tinha “um conflito” entre timeshare e multipropriedade. Houve um momento no Brasil que teve um debate sobre o que é melhor: timeshare ou multipropriedades? Obviamente, nós, como WAM, defendíamos a tese da multipropriedades. Era muito bem embasado, a gente fazia isso muito bem. É óbvio que o timeshare tem suas vantagens, mas a gente enxerga que a multipropriedade é o produto atual.
O setor hoteleiro para vocês foi a grande academia de negócios e chamou atenção do mercado?
Freitas – Sim, foi a escola.
André – E é engraçado, Leandro, que você está falando é tão importante para nós, que em um dado momento, a gente começou a ser procurado por incorporadoras tradicionais. Nós tivemos conversas com as três maiores incorporadoras do País entre outras. Como o Freitas colocou, sobre o conceito imobiliário, tomou muita força, chamou atenção. Era inimaginável um grupo líder de mercado parar para olhar, por exemplo, um produto desse antes e aí o cara chamar lá na sede dele e parar o trabalho dele, o dono, sentar com a gente para escutar o modelo. Nós íamos nos empreendimentos que ele tinha para podermos começar a discussão de um negócio desse, era porque realmente o modelo do negócio.
Qual foi o maior desafio na WAM?
Freitas – Em 2013, faturamos por volta de R$ 14 milhões. Em 2019, batemos R$ 1 bilhão de faturamento. Os principais veículos de Economia destacaram a WAM.
André – Os que mais faturavam, como o Rio Quente, não chegavam a R$ 500 milhões. Mais que dobramos grupos tradicionais e sólidos, com até 40 anos de operação, em cinco anos de mercado. Fomos a primeira empresa do setor a bater R$ 1 bilhão. Aliás, em 2019, passamos a ser a 1º no mundo em vendas e em contratos. Neste ano, foram 39 mil contratos. Operando apenas no Brasi. A WAM bateu a maior empresa do mundo (a Wyndham), que vendia em dezenas de países.
Freitas – Antes disso, chegamos a vender (VGV) de R$ 2 bilhões. Porque primeiro você vende, depois você reconhece a receita. Então não adiantava só vender, nós queríamos chegar superar a casa do bilhão de faturamento. Nesta época, a empresa WAM verticalizou e tinha mais de 70 CNPJs de empresas do grupo. Só de SPE, tinha mais de 20 ativos. Eram 5 mil colaboradores em todo País.
E os desafios?
Freitas – O grande desafio externo do nosso setor, não só da WAM, é o financiamento. Se constrói um prédio em até quatro anos, vende em um ou dois, mas recebe em até nove anos. Esse foi o grande desafio que resolvemos por meio do mercado de capitais. Entrei na Faria Lima apresentando, em 2014, com uma pastinha, visitando os bancos de investimentos. Era um negócio que ninguém acreditava. Fizemos várias operações financeiras porque não tinha financiamento. Outro desafio é a condução da sociedade, que é algo difícil. Nós tivemos muita dificuldade neste ponto. Estes foram os maiores desafios. Dez anos de sociedade, na WAM, foram muito difíceis.
André – Não colocamos muito os empreendimentos como desafios, né, Freitas. Cada empreendimento tem a sua característica e as dificuldades serão enfrentadas. Mas quando você começa a expandir e crescer demais, você vai esbarrando no capital humano. Está aí o desafio. O Freitas teve uma ideia sensacional que foi criar a Universidade Corporativa dentro da WAM, para dar foco na formação de profissionais no volume que a expansão exigia.
Freitas – Eu arrisco a dizer que 80% dos profissionais que estão no mercado passaram pela WAM.
E a saída da WAM, como foi?
Freitas – Antes da pandemia, percebemos que estava muito caro o financiamento da empresa, dos novos empreendimentos. Na verdade, começamos o trabalho com a XP para fazer o IPO, em 2019. Era a solução para bancar os novos projetos sem ficar pagando juros. Iríamos vender de 20% a 30% da sociedade. Em fevereiro de 2020, estávamos com material pronto para ir ao mercado. Não era para acontecer, mas faltou muito pouco. A pandemia da covid-19 foi declarada em março de 2020. Travou a economia e o segmento do turismo foi o que mais sofreu. Com a pandemia, suspendemos o contrato com a XP. Buscamos outra solução. Um credor da WAM entrou como sócio, para alavancar a empresa.
Aí o cinto apertou…
Freitas – Sim. Estávamos falando com vários players. Aí veio a pandemia em 2020 e 2021. Apertou total. Mas não mandamos nenhum funcionário embora. Também não tivemos nenhuma morte no grupo por covid. Nos casos mais graves, nós ajudamos. No final de 2021, foi onde começou a crise societária e, no começo de 2022, nós sentamos, todos os sócios, e resolvemos vender. Já havia um desgaste muito grande com esse investidor. Em fevereiro de 2022, vendemos 100%. Cada um vendeu sua parte a ele, que se tornou o único dono.
Vira a página e começa a AM Invest? Agora mais multissetorial que a WAM?
Freitas – A AM nasce logo em seguida.
André – Essa diversidade, eu e o Freitas, já até por conta de todo esse atrito societário, ora com o investidor ora com o outro sócio, resolvemos investir na pessoa física. Não pensávamos ainda na AM. Ali era a pessoa física investir em outros segmentos porque, em um dado momento, sabíamos que o futuro da WAM era incerto. Tínhamos de dar sequência na vida. Foi quando o Ribamar Cruz, que é o nosso médico, nos propôs uma conversa. Estava diante de um fluxo grande de pessoas, mas acabava perdendo oportunidade. Ele nos buscou para associar. De pacientes a sócios. Entramos como sócio do Ribamar, na clínica, um pouco antes de sair da WAM.
E o Rildo Lasmar?
André – Foi consequência. A clínica do Ribamar fica dentro da clínica do Rildo. O Ribamar é a parte de Nutrologia. Começamos o trabalho. Acertamos a saída da WAM, quando, de fato, surgiu a AM como negócio. O trabalho com o Ribamar, chamou a atenção do Rildo. Logo nos tornamos sócios também. Iniciamos a diversificação que o Freitas comentou, pois já tínhamos dois restaurantes, em São Paulo, e outro em Goiânia.
Quando você olha no caderninho do Freitas, quando está previsto lá o IPO da AM ou o primeiro bilhão?
Freitas – Não descartamos um IPO. Aliás, é o caminho e deve vir quando a AM Invest chegar a R$ 1 bilhão de faturamento. A previsão é para 2026.
O que foi construído em 2023 para cada setor e qual é a previsão para 2024?
André – Essa pergunta é interessante, porque quando entramos no negócio especificamente de saúde já sabíamos que este tinha boas receitas, mas nos deparamos com uma surpresa, que ocorre de forma geral: a parte de gestão precisava avançar. Os médicos são brilhantes, entregam resultados maravilhosos no que fazem, mas quando se avalia a gestão, questão de controle, parte fiscal, tem muito a melhorar. Nas áreas de saúde, restaurantes e a própria área de entretenimento, tivemos um ano de 2023 de arrumação da casa, para 2024 acelerar. Já temos resultado. A nova gestão gerou confiança em nossos sócios, trazendo oportunidades, como foi o caso de abrir a unidade no Flamboyant. O Rildo se sentiu seguro em ver a nossa atuação e falou: ‘cara, eu tenho confiança de dar um passo como esse, no Flamboyant.’ Vai ser inovador. Nosso espaço de saúde ainda conta com a Belato Clinic e estamos trazendo uma outra parceira, na área de cirurgia plástica. Temos ainda um planejamento de expansão da IBO, que é a parte nossa de odontologia mais simples. Para 2024, vamos olhar outros projetos, como entrar em um negócio de cosmético.
Freitas – o grupo AM consolidado deve fechar o ano de 2023 com faturamento da ordem de R$ 150 milhões e a previsão de R$ 400 milhões.
E a internacionalização da marca?
André – Em 2024, estamos em fechamento de parceria na Região Serra da Estrela em Portugal como você anunciou recentemente Leandro, já iniciaremos a operação agora, dezembro de 2023. Temos um projeto de levar a marca da área de saúde para fora também e o primeiro destino que a gente foi conversar foi Dubai. Visitamos um sheik, amigo do Rildo, que nos convidou para ir para lá. Seguramos o projeto porque o foco é a unidade do Flamboyant.
E o turismo?
André – O principal segmento da AM, hoje, é o turismo. No distrato da WAM, ficamos com três empreendimentos em Caldas Novas. É um teste para nossa força de gestão. Eram três empreendimentos meio que subjugados, não recebia atenção, mas depois que vieram para a AM, foi impressionante como avançaram.
Freitas – Hoje, nós temos um desafio. Nós montamos a multipropriedade no País, hoje o nosso desafio é reinventar a multipropriedade e sem vaidade, obedecendo o ‘non compete’ que assinamos com venda da WAM, lógico. Mas até distanciamento contratual provisório tem sido importante para amadurecer a compreensão do setor, revisar conceitos e repensar soluções.
Vocês têm quantos sócios?
Freitas – No restaurante, nós temos dois. Na área de saúde, são oito. E temos os executivos da AM, que estimulamos a virar sócios. Não queremos executivos, mas sócios. É uma cultura nossa, crescer colaborativamente e beneficiando a todos.
André – É mais leve. Está ligado à questão da maturidade, da experiência que juntamos e aprendemos a usar a favor do negócio. No passado, fomos percebendo que algumas pessoas que iam merecendo se tornar sócios dentro do processo iam tendo dificuldade de não se transformar. Aqui na AM, temos uma leveza um pouco maior no trato do tema. Tem meritocracia, então o cara mereceu. Vamos dar aqui essa chance. Assim foi comigo lá atrás, graças ao Freitas. Não queremos abraçar o mundo sozinhos.
E as novas oportunidades, aparecem?
Freitas – Outra coisa importante é a seletividade, hoje, somos extremamente seletivos. Na WAM, nós deixamos de falar muitos nãos. Hoje a gente só fala não (risos). Nós só falamos não porque somos procurados duas, três vezes por semana para novos negócios, porque temos de ter foco. Não queremos dez projetos, nós queremos dois, três bons projetos e acabou.
Vocês são de uma safra nova de empreendedores goianos, um perfil híbrido de executivos e empreendedores. Como estão lidando com essa convergência?
Freitas – A WAM tinha muito a minha cara e a cara do André. No mercado, nós não tínhamos muita noção disso, porque você está envolvido no dia a dia. Hoje, nós conseguimos enxergar que o mercado via isso com bons olhos, porque a partir do momento que deixamos a WAM, nós saímos da sociedade, eu e o André, estamos sendo muito demandados.